terça-feira, 8 de novembro de 2016

Construindo um Observatório Amador


Apesar de meus conhecimentos técnicos serem limitados, eu consegui projetar e construir com sucesso um observatório amador capaz de ser utilizado remotamente.

Em toda essa jornada poucas vezes eu encontrei um material em português que me auxiliasse nessa tarefa. Então decidi detalhar um pouco os desafios encontrados e algumas soluções possíveis.

Espero que esse material seja útil para outras pessoas que também tenham interesse em realizar o sonho de construir um observatório amador.

Nesse post eu pretendo dar uma introdução mais geral à construção.
Em posts futuros vou entrar nos detalhes da construção do telhado e do hardware e software envolvidos na automação do observatório.

Bom, vamos começar...



Vantagem de se ter um observatório



A grande vantagem de ter um observatório é poder deixar o equipamento (telescópio, câmeras e etc) sempre montados e prontos para uso.

Imagine uma EQ6 com um OTA 10", uma configuração dessas pesa entorno de 50kg. Transportar, montar, alinhar todo esse equipamento a cada sessão de astrofotografia é uma tarefa enfadonha. Isso acaba desmotivando a realização de sessões de observação.

Poder deixar esse equipamento montado em um local seguro e totalmente pronto para uma sessão de observação facilita muito.

Além disso, é possível com o tempo alcançar um alinhamento próximo da perfeição. Isso torna seus resultados ainda mais promissores.


Tipo de observatório



Existem vários tipos de observatório, mas os mais comuns são o observatório em cúpula (dome) e o telhado deslizante (roll-off roof).

O observatório em cúpula é mais caro e mais complexo. Contudo tem a vantagem de conseguir observar uma região maior do céu (principalmente as próximas do horizonte) e ainda manter os equipamentos mais protegidos, pois para a observação com ele é necessário abrir apenas uma pequena "portinhola".

A maior complexidade vem do fato de você precisar manter a tal "portinhola" alinhada com o posicionamento atual do telescópio. Isso envolve a utilização de um hardware+software capaz de se comunicar com a base do telescópio e comandar motores de forma a posicionar a cúpula no local correto.

Hoje no brasil existem alguns fabricantes de cúpulas. Vale a pena fazer um orçamento com eles para se ter uma ideia dos valores e da possibilidade de construir um desses para você.




O tipo telhado deslizante tem a construção e operação mais simples. Basicamente é um telhado sobre trilhos que pode ser aberto manualmente, ou através de um motor elétrico (desses de abrir portão elétrico residencial). A desvantagem desse esquema é que você basicamente perde a visibilidade do céu em altitudes proximas ao horizonte. Isso por que o telescópio fica rodeado pelas paredes do observatório.

É possível porem construir alguns mecanismos para diminuir essa perda do céu. Um deles é construir paredes que também se abram, ou um pilar que eleve o telescópio, ou ainda aumentar a área de construção do observatório (diminuindo assim o ângulo formado entre o telescópio e as paredes). Contudo, nesses casos o vento pode acabar sendo um problema, pois o telescópio passar a ficar mais exposto ao clima local.

Outro ponto negativo do telhado deslizante  é que com o telhado todo aberto todos os equipamentos do observatório estão expostos as intemperes do clima local.

O OCA é do tipo telhado deslizante.  Então a partir de agora vamos nos concentrar na criação desse tipo de observatório.





A escolha do local



Uma das coisas mais importantes para a construção do observatório é a escolha do local. Um bom local de observação deve possuir um céu sem muitas obstruções, com baixa poluição luminosa (PL), ambiente mais seco e com pouca incidência de ventos. Mas nem sempre é possível encontrar um local assim a disposição.


A PL (normalmente encontrada em grandes cidades) é uma inimiga mortal da astrofotografia. Quando um céu possui muita PL é complicado realizar exposições de longa duração (que são necessárias para captura de objetos de céu profundo). A PL também é capturada nas fotos e basicamente o céu que deveria ser escuro, acaba se tornando branco. Existem filtros capazes de barrar a PL. Eles não são a solução ideal, mas podem ser uma opção para quem não tem como mudar o local da observação.

As astrofotografias planetárias sofrem menos com a PL, pois no geral os objetos observados são mais luminosos e os frames são tirados em curtas exposições. Assim a PL fica menos evidente. Essa categoria de astrofotografia é muito indicada para quem vai realizar astrofotografia em uma área urbana densamente povoada.

Mas voltando ao assunto do local do observatório, um bom teste inicial é levar um telescópio até o local desejado e realizar uma sessão de observação ali. Isso vai  permitir a você entender os problemas e a qualidade do céu que você vai encontrar ali.

Esse local pode ser a sua casa, seu quintal, alguma propriedade rural da família e etc.

Muitas pessoas constroem o observatório na própria casa (ótima opção se você mora em uma cidade pequena com baixa PL). Isso é interessante, pois você vai ter grande facilidade em manipular os equipamentos do observatório. Além disso, o nível de automação do observatório pode ser drasticamente reduzido, pois você vai estar ali presente, podendo assim operar os equipamentos e realizar ações as ações necessárias. Ex: abrir o telhado do observatório, fechar o telhado em caso de chuva, focalizar manualmente as câmeras e etc.

A desvantagem dessa opção é que além da PL, muitas vezes existe um telhado seu ou do vizinho que vai "tampar" boa parte do seu céu. Limitando assim o que você pode ver.

Outra opção é construir o observatório em um local remoto. De preferencia afastado de grandes centros urbanos. São nesses lugares que você vai conseguir os melhores resultados na astrofotografia.

Essa opção pode se dividir ainda em duas:

  •       Pode ser um local afastado, mas que você pode visitar facilmente (ex: uma chácara próxima da sua casa). 
  •           Ou pode ser um local afastado que você só vai poder visitar de tempos em tempos.

No primeiro caso você pode construir o observatório com pouca automação. E pode utilização estando fisicamente no observatório.

Mas no segundo caso será necessário automatizar todo o observatório. Pois ele terá de ser capaz de ser operado remotamente. Esse é o caso do OCA e vamos nos concentrar nesse caso.


Planejamento



Definido o local do observatório, é hora de planejar e realiza a construção.
Vou apenas passar algumas dicas importantes que você deve levar em consideração na hora da construção. Caso contrario poderá ter que refazer muita coisa.


Fundação
 


A fundação do observatório deve ser bem reforçada. Principalmente se ele for construído no segundo andar. Um piso frágil pode apresentar vibrações, o que pode complicar as observações. Além disso, é comum ter varias pessoas (curiosos) ao mesmo tempo ao redor do telescópio.

No caso do OCA foram construídas varias estacas de 4 metros de profundidade no piso térreo (estacas de concreto e ferro). Essas estacas servem para criar uma fundação consistente.

A laje do segundo piso também foi reforçada com varias camadas extras de vergalhão. Uma camada extra de cimento também foi utilizada. Além disso, foi escolhido um local onde uma parede do primeiro andar atravessa todo centro do observatório, criando assim uma sustentação extra no centro da construção. Foi criada uma coluna reforçada embaixo de onde o telescópio vai ficar (isso é importante para evitar vibrações; se possível, o ideal é isolar essa coluna do resto da construção). Essa coluna foi construída com 4 metros abaixo do piso térreo. Isso é muito importante e deve ser projetado e construído com atenção (problemas de vibração podem inviabilizar o uso do observatório).

Outra questão importante é deixar um tubo para passar a fiação que sai do telescópio. O ideal é que esse tubo seja fixado sob o piso. Ele deve começar próximo ao pilar ou tripe e deve conduzir os fios até próximo ao computador do observatório. Dessa forma o chão do observatório fica livre de fios e você vai poder andar ao redor do telescópio sem problemas.

Pilar ou Tripe



Com relação ao telescópio, você pode escolher deixar o telescópio no tripe original ou então utilizar um pilar.

A vantagem do tripé é que você pode realizar com facilidade pequenas mudanças de posição do telescópio. A desvantagem é que o tripé ocupa um espaço maior do observatório e ainda sempre existe a possibilidade de alguém esbarra no tripé e desalinhar o telescópio.

É importante definir qual será a escolha antes de iniciar a construção, pois depois de construído fica mais complicado instalar um pilar no observatório.

No caso do OCA, eu utilizei um pilar. O pilar foi construído pelo Edson Garcia. Na construção do pilar você deve levar em consideração à altura das paredes do observatório.

O ideal é que a altura máxima do seu pilar+montagem+telescópio seja um pouco menor que o pé direito do observatório. Com isso você evita problemas de choque do telhado com o telescópio.

Mas você pode escolher deixar o telescópio mais alto que as paredes. Nesse caso você vai precisar sempre garantir que o telescópio esta em uma posição segura antes de fechar o telhado. É possível fazer isso usando alguns sensores instalados na montagem.

Também é importante projetar um pilar que possa facilmente ser adaptado para outras montagens. Pois é comum com o tempo você trocar seus equipamentos. Então é importante que o pilar seja bem construído (bem solido) e que a parte superior do pilar possa ser substituída para se adaptar a diferentes montagens. O pilar do OCA foi construído dessa forma.

Caso seja escolhido a utilização de um pilar, durante a construção do piso do observatório é necessário “chumbar” uma estrutura metálica para posterior fixação do pilar.

No caso do OCA foi confeccionada uma placa de ferro de 3mm  de espessura medindo 35x35cm. Nessa placa foram soldados 4 barras de rosca sem fim de meia polegadas. A placa foi inserida na construção da laje de forma que apenas as 4 barras ficaram expostas no piso. 

Essas barras meia polegadas são utilizadas para fixar o pilar. É importante notar que os furos do pilar (onde as barras de meia polegada vão entrar) são dependentes do alinhamento polar. Assim é preciso bolar uma estrategia para furar o pilar de forma a conseguir posteriormente um bom alinhamento polar.



O ponto vermelho deve ser instalado apontando para o polo sul celeste. O ajuste fino é feito posteriormente na cabeça da montagem.





Paredes



A altura da parede do observatório no geral é menor do que uma parede de construção normal.

A altura das paredes do observatório deve estar relacionada com o tipo de observação que se pretende fazer no observatório, ao tipo e tamanho do telescópio e também a altura dos usuários do observatório.

Como exemplo, podemos idealizar as paredes para um observatório de observação visual usando um telescópio Newtoniano de 1200mm de distancia focal. Considerando pessoas com 1,80m de altura, o ideal é que as paredes tenha ~1,85m. Pois o ideal nesse caso é que o pilar seja o mais baixo possível, deixando o OTA mais baixo e facilitando a observação. Mas a parede também tem que ser alto o suficiente para a pessoa de 1,80 entrar sem muito problema.

Contudo, se a ideia é fazer astrofotografia, você pode fazer paredes um pouco mais alta (~2m para o exemplo anterior). Você compensa essa altura construindo um pilar mais alto.

As paredes do OCA tem aproximadamente 2m. O pilar utilizado é um pouco mais alto que o tripé original (na posição mais baixa). O conjunto pilar+montagem+ota fica a poucos centímetros mais baixo que a parede. É importante deixar um pouco de folga, pois no futuro você pode querer usar um telescópio maior.

Também é possível construir uma plataforma ao redor do telescópio para facilitar a observação visual.

As paredes também devem ser bem reforçadas (pode ser de madeira, alvenaria, metal, etc), pois é comum furarmos as paredes para "pendurarmos" diversos equipamentos no observatório (ex: câmeras de captura de meteoros, câmeras all sky, centrais meteorológicas, alarmes e etc).

No caso do OCA, na parte de cima da parede eu deixei a ferragem exposta. Nessa ferragem exposta foram soltados os trilhos onde o telhado corre.



Parte elétrica



O ideal é ter um disjuntor especifico para o observatório. Também é importante criar um bom aterramento e se possível instalar dispositivos para conter surtos elétricos (ex: Clamper).

É importante escolher uma posição para deixar os equipamentos eletrônicos do observatório (PC, nobreak, equipamentos de rede e etc). Nessa posição é interessante construir varias caixas para abrigar as tomadas.

Como o telhado vai abrir, as luzes devem ser fixadas nas paredes laterais. Pode ser usada aquelas luminárias tipo tartaruga (para o caso de observações visuais, pode se pintar essas luminárias de vermelho, diminuindo assim o impacto da luz no olho humano). O ideal é ter pelo menos duas luminárias em paredes opostas. Assim a iluminação vai preencher todo o ambiente.





Telhado


Muitas pessoas utilizam madeira para a construção do telhado. Contudo, hoje em dia a construção com ferragem está saindo mais em conta. Se tornando assim uma boa opção. Optei por fazer o telhado do OCA utilizando ferragem.



É importante definir para qual lado o telhado vai abrir. O  próprio telhado o observatório acaba atrapalhando a visão do céu. Assim, o ideal é que o telhado abra no sentido leste -> oeste ou oeste -> leste. Dessa forma você terá a melhor visão possível dos lados norte e sul. O telhado ficando do lado oeste ou leste não atrapalha tanto a visão, pois os objetos celeste parecem se mover de leste  para oeste de acordo com os movimentos da terra. Assim durante a noite é possível  ter visada de todos os objetos (variando também em diferente épocas do ano).

Apos realizada as medidas das paredes do observatório, foi construído uma estrutura para servir de trilho. Essa estrutura foi soldada na parte superior das paredes do observatório. Esse trilho se estende além das paredes do observatório, sustentando assim o telhado quando ele está aberto. Dessa parte estendia descem pilares de ferro que estão apoiados na laje da construção (também é possível usar travas francesas para realizar esse poio).

Foi construído uma estrutura de ferro em formato retangular sobre 4 roldanas. Essa estrutura foi coberta com telhas de alumínio e foi posicionada sobre os trilhos do observatório.

É importante que o telhado seja um pouco maior que as paredes do observatório, protegendo assim observatório das chuvas.

Para o caso de abertura manual do telhado, é importante construir suportes para prender o telhado aos trilhos. Pode ser usados para isso cadeados. Com isso o telhado não vai sair voando em uma ventania. Outra opção é fazer o telhado correr dentro tubos de ferro.

No caso do OCA o telhado fica travado pelos dois motores elétricos. Um de cada lado. Além disso, foram instaladas duas travas elétricas. Dessa forma o telhado fica bem travado.










O telhado pode ser facilmente automatizado. Para isso você pode usar motores de portão. Pode ser usado um motor ou dois. Isso vai depender do peso da sua estrutura.

Usando dois motores eles devem trabalhar sincronizados. Qualquer bom instalador de motor de portão sabe realizar essa configuração.

No caso do OCA foram utilizados dois motores para portões basculantes.  A vantagem de usar o motor do tipo basculante é que o telhado fica preso ao motor. Isso evita que ventos levantem o telhado.




Outra opção é usar motores com cremalheira.

É importante também solicitar ao instalador do portão que configure um fio para acionar o motor usando um botão.


Basicamente é um par de fios que quando são encostados um no outro o portão abre/fecha. Isso possibilita a você automatizar a abertura do telhado usando um rele. Vamos ver como fazer isso nos próximos posts.





























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